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Verve nua em semelhança
de água e brilho
inflexível
contra o vento, uma adaga
ou silaba tão cortante que perpassa
o outro lado
da carne
no tempo em que a pálpebra
recolhe
os novos olhos, sóis, oásis,
humor aquoso
e outros lagos multicores,
seres avessos
como dois ventrículos sonoros
no lado escuro do corpo,
pêndulos siameses de idênticos
sopros e pesos
ao fundo das sombras:
ária desmedida
de paixão em riste.
Sobre a poesia de Contador Borges
A Morte dos Olhos:
Gostei muito, em primeiro lugar, do ritmo, infalível, contínuo, sustenido de cabo a rabo; depois, da capacidade de espargir o corpo, desagregar a realidade, a partir de um tom, digamos, espiritual, que, por sua vez, se sustém o tempo todo; o poema flui, meandro luminoso, adentrando as terras complexas do corpo astral e próximo, fazendo do palpável um exercício respiratório, um exercício espiritual deslumbrante.
José Kozer
O reino da pele:
se há uma aura de misticismo nessa poesia, trata- se de um misticismo pagão, carnal. O próprio titulo do livro é uma referência a escritores que, de Sacher-Masoch (A Vênus das Peles) a Georges Bataillee (História do Olho), fazem do ato sexual uma liturgia cujo altar é o corpo —um corpo segmentado por fetichismos que perturbam a ordem natural, Conferindo uma estranha nobreza à pele dilacerada, aos membros que definham e apodrecem como num bronze de Giacometti.
Manuel da Costa Pinto
Na poesia de Contador, a única certeza é a total ausência de estabilidade, de imutabilidade ou perenidade: no livre fluxo de imagens — vale dizer, na escritura típica de um barroco transtornado — nasce uma gama de dúvidas e possibilidades em que se fundamenta, talvez, a única chance de liberdade.
Claudio Daniel
Contador Borges é um poeta da imagem pura, do salto, um ser da linguagem. Não se vale do pensamento para explicar. Não é um autor da visão, mas da alucinação. Deforma o mundo literalmente para formar o seu próprio mundo.
Fabricio Carpinejar
Angelolatria:
(...) Assim, na poesia de Contador Borges, aquilo que chamamos forma não é a fatura, nem a função poética, nem o trabalho ornamental dos signos. Não. A forma dessa poesia está em abrir a janela e ver que cada dia e cada coisa são únicos — não porque sejam diferentes, mas porque sua diferença é a da busca singular de um fim, de uma catarse.
(...) É simplesmente a consumação natural de onde decorre toda e qualquer beleza. Pois a beleza é prêmio, é moira.
Antonio Medina Rodrigues